Por Cláudia Lamego
O escritor gaúcho Reginaldo Pujol Filho estará no Rio a partir do dia 14 de junho para ministrar um curso sobre Literatura Contemporânea, junto com mais dois professores de Porto Alegre (Cristiano Baldi e Rodrigo Rosp), que mistura aulas práticas de escrita criativa e encontros de inspiração com escritores. Nessa edição, o curso terá a presença de outros dois autores da Record, Marcelino Freire e Cristovão Tezza, além do jornalista e escritor Sergio Rodrigues.
Nessa entrevista, Pujol Filho, que lançou pela Record Só faltou o título, uma crítica ácida ao mercado literário num romance policial em que o narrador-protagonista é um escritor frustrado e mal-humorado, fala da produção do livro no seu Mestrado em escrita criativa na PUC do Rio Grande do Sul e dá detalhes do curso que dará no Rio. Para os interessados, a inscrição pode ser feita no site http://www.perestroika.com.br/cursos/rio-de-janeiro/txt/
O curso começa no dia 14 de junho e vai até 2 de julho, com aulas às terças e quintas, das 20h às 22h30min e aos sábados das 10h às 13h30min. A conversa com Marcelino Freire será no dia 16 de junho e o encontro com Cristovão Tezza, no dia 21. Já Sergio Rodrigues conversa com os alunos no dia 29 de junho.
Você contou, no lançamento de Só faltou o título, aqui no Rio, que o seu livro nasceu do mestrado que fez na PUC do Rio Grande do Sul e que lá têm aportado e surgido alguns novos autores brasileiros, como a Débora Ferraz. Esse é um curso para novos autores? Você pode contar um pouco mais de como ele funciona?
A pós-graduação em Escrita Criativa da PUCRS (com mestrado e doutorado) é resultado de uma longa tradição da universidade de entender a criação literária (assim como os cursos de poéticas visuais, teatro, música, etc.) como um campo de investigação e de conhecimento e de investigação através da criação. Para ter uma ideia, a oficina do Assis Brasil, pedra fundamental disso tudo, está integrada à PUCRS há mais de 30 anos. Bom, mas e aí, né? O que acontece nesse curso? Na prática, temos cadeiras específicas para criação literária, de roteiro, etc., mas também dividimos muitas disciplinas com a teoria da literatura, o que eu acho ótimo. Temos que, nesse universo, cumprir uma carga de créditos como em qualquer outro mestrado e doutorado e, claro, fazer nossa dissertação/tese. E aí surge a diferença. O trabalho final desse curso pode ser um romance, um livro de contos, de poesia, um roteiro, um libreto, uma peça (tudo isso já rolou) que é escrito ao longo do curso com o suporte do orientador. E, além da peça, digamos, criativa (“digamos” porque uma tese e um dissertação de outra área também pode ser) o aluno tem que entregar junto um ensaio que passeie ao redor do seu trabalho literário. Pode ser um ensaio sobre o processo, sobre um tema abordada, sobre a técnica, pode ser muita coisa. Em resumo (não tão resumido é isso). Não é um curso que se intitule como formador de escritores, é mais um espaço de pensamento e criação, acredito eu. Tanto que está aberto para diferentes tipos de texto. Mas, obviamente, vem atraindo muito escritores jovens, criando um ambiente muito legal e gerando trabalhos muito fortes. Além da Débora, que é minha colega de mestrado, estão por aqui ou passaram por aqui, Amílcar Bettega, Diego Grando, Carol Bensimon, Davi Boaventura, Moema Vilela, Cristiano Baldi, Rodrigo Rosp, Luis Amabile, Alexandre Rodrigues, ih, uma galera.
Como surgiu a ideia para esse curso de escrita criativa, que agora você vem dar no Rio? Como você vê a demanda crescente por oficinas e cursos de escrita, num momento em que pesquisas mostram retração no mercado e um índice de leitura do brasileiro muito aquém do esperado? Como resolver essa equação/contradição?
A Perestroika, a escola de atividades criativas onde vamos dar aula no Rio, surgiu aqui em Porto Alegre há 10 anos e depois se espalhou pelo Brasil. E há um tempo, o Baldi (outro dos professores do curso) se deu conta de que eles tinham curso de tudo quanto é coisa, mas não tinham nada voltado para a literatura. Então ele convidou a mim e ao Rodrigo Rosp para pensarmos num modelo de curso. E era um baita desafio, porque estamos falando de criar um curso de escrita criativa numa cidade que tem, no mínimo, as oficinas do Assis e do Kiefer (sem falar de tantas outras que surgem todos os dias). Mas, assim, se é para falar do que o Assis e o Kiefer falam, puxa a gente não ia se meter. Era preciso fazer algo, pelo menos, diferentes. Então começamos a apontar questões que nos interessavam na escrita e não havíamos visto, ou havíamos visto ser pouco abordado quando frequentamos oficinas (os três fizeram uma ou outra). Assim surgiu a parte prática do curso na qual trabalhamos essas ideias com leituras e exercícios. Mas também achávamos legal que o curso apontasse já de cara uma abertura. Para parar com aquela ideia de “ensinar um jeito de escrever”. Assim estabelecemos uma lógica de convidar escritores bem diferentes entre si para encontros de inspiração com os alunos. Daí fica uma coisa meio esquizofrênica, mas muito rica, de vir numa semana um cara, baita escritor, e mostrar uma série de ideias. Só que na semana seguinte, vem uma baita escritora e mostra outra série de ideias. E aí a gente começa a ver que fazer literatura é um campo aberto, é criar caminhos, não é seguir moldes.
Puxa, agora quanto a questão dos leitores. Esse é um paradoxo muito louco que me lembra o livro do Paulo Scott – e também o meu personagem, o Edmundo Dornelles –, O Ano em Que Vivi de Literatura. As pesquisas falam de poucos leitores, falam de queda nas vendas, mas temos festivais, prêmios, oficinas, graduações, pós-graduações voltadas para a escrita. É um paradoxo. Mas sabe que eu acho que oficinas e cursos têm um papel legal aí. Porque é incrível que tem muita gente que quer escrever e lê pouco, ou desconhece a produção contemporânea. E eu faço questão de que os cursos sempre seja um espaço de leitura, de troca de livros, de apresentar novos nomes. E sempre rola. Sempre tem alunos nos cursos que nunca ouviu falar nos convidados que a gente traz. E acaba descobrindo esses autores. E lendo eles. E, quem sabe, recomendando. É um pontinho a mais nesse trabalhinho de formiguinha que é criar, conquistar, encontrar leitores no Brasil.
Cristovão Tezza, do Sul; Marcelino Freire, do Nordeste; Sérgio Rodrigues, do Sudeste. Ao convidar esses autores para o curso, você pensou, propositalmente, na diversidade de origens dos autores ou foi apenas coincidência? O que os alunos podem esperar dessa mistura?
Olha, não tinha me dado conta da diversidade regional. Mas é interessante olhar por aí também. Acho que não deixa de ter a ver com a nossa proposta de abertura, de propor que os alunos percebam que a literatura é um espaço aberto, é um lugar onde convivem diferentes modos e vozes que fazem boa literatura à sua maneira. Esse é sempre o objetivo, que o aluno não saia do curso com uma ideia de literatura. Mas com muitas, variadas, às vezes até conflitantes, por que não? E acho que é isso que o pessoal pode esperar: perspectivas, olhares sobre escrever, sobre criar múltiplos, variados. Um convite para escrever com a própria voz, sem modelos rígidos de boa e má literatura. Perceber que há muito sendo feito e que isso significa que dá para fazer muito mais. É ver nesse caleidoscópio uma abertura para criar seus próprios texto e também para descobrir novas leituras.